domingo, 31 de outubro de 2010

Morte Certa




Passava a vida a pensar na morte. O suicídio era coisa que o fascinava. De repente apercebeu-se de que iria morrer mais cedo do que pensava e só conseguia pensar em viver, já não queria morrer. Passou a viver com medo da morte que durante tanto tempo desejou. Medo, medo, medo, de perder, de cair no esquecimento daqueles de quem nunca se esquecia e desfazia-se em lágrimas chorando todas as suas mágoas. Despediu-se sem nenhum adeus porque sabia que se Deus realmente existisse teria ouvido as suas preces nos seus momentos de desespero, na altura correcta, e não só agora. E foi-se embora sem demora para não chegar tarde à sua Morte Certa!

TocArte



Carrego as minhas baterias para te carregar. Preparo-te, preparo-me e sento-me.
Toco, estremeço, vibro. Avassaladora sensação de poder quando o corpo se deixa comandar pelo cérebro, pela vontade. Os membros entram em modo automático e parecem ganhar vida própria e eu própria me sinto outra. E (re)toco, (re)estremeço, (re)vibro até me cansar, até à plena satisfação alcançar.
Sou corpo, movimento, vida e sigo as batidas do coração; do meu, do teu, de quem me quiser ouvir, de quem me estiver a sentir e sinto liberdade quando o meu corpo se funde com o instrumento sem entraves, sem atrasos, sempre no tempo, mesmo em contratempo e sinto que marco, que dou horas como um relógio sempre certo, que nunca se atrasa nem se adianta. Toque mecânico mas ao mesmo tempo humano. Físico, espiritual e agradável de ouvir, perfeito para tocar, real para sentir, se não for nada mal.
Tocar bateria é uma arte e como outra qualquer requer paixão, dedicação, vocação, razão de viver, de tocar pela Arte _ TocArte!

domingo, 24 de outubro de 2010

Lágrimas



Calo-me e fico a ouvir tudo o que tens para me dizer. Começo a sentir os olhos a picar e tento conter as lágrimas que teimam em saltar cá para fora e em rolar pela minha face pálida abaixo, que sinto enrubescer repentinamente. Tudo o que te oiço contar são verdades, nada mais do que verdades. Limpo a cara molhada e paro um pouco. Ambos respiramos fundo enquanto tu também fazes uma pausa no teu intenso discurso. Recomeças a falar e eu a chorar novamente sem me conseguir controlar. Peço-te que pares, pois já não aguento com dores no estômago de tanto rir.
Só tu… para me fazeres recordar os bons velhos tempos!

domingo, 17 de outubro de 2010

Quem dança seus males espanta




Por vezes não sei o que faço nem para onde vou. Mas aventuro-me, pois não quero nunca arrepender-me do que não fiz. Tenho tido sorte. Aparece sempre uma mão desconhecida que me guia e me leva pelo caminho certo, no tempo certo, e me conduz com os passos correctos. A mão desconhecida depressa se transforma em cara amiga e logo aparece outra e mais outra e tudo se repete. O espírito de convívio, partilha, união e alegria tornam cada momento mágico, cada música única, cada dança especial, cada par ímpar. Dou voltas e voltas e voltas e mais voltas sem parar, até me cansar. E quanto mais me canso fisicamente, mais a minha mente se solta e se liberta de tudo aquilo que a aperta. Uma espécie de terapia que me deixa de corpo, coração e alma quentes mas de cabeça fria. Uma felicidade, euforia e energia que se apoderam de mim. É uma coisa que me fascina, é uma coisa que me encanta. Aproveito e digo alto e a bom som para toda a gente ouvir: Quem dança seus males espanta!

Esta é dedicada ao Tradgang_AZUL

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

ESTRANHOS




Parece que só me conheces quando estamos sós
Mas já nem a sós sinto que sejamos nós
E por isso talvez não me conheças assim tão bem
Nem eu a ti, tu que és não sei quem
Não me queres bem
Se não tal coisa não me farias
Pois se me conhecesses saberias o mal que me fazes
Sempre que me deixas
Sempre que me abandonas
Sozinho entre estranhos
Acompanhado por pessoas
Que não são mais do que sombras
Para mim e quem sabe também para ti
Parecem-me apenas ondas, num agitado vai e vem
E por isso talvez não te conheça assim tão bem
Mas será mesmo que alguém poderá conhecer realmente alguém?
Quando descobrir aviso
Com o meu enorme sorriso a acompanhar
Não compreendo esta minha ânsia de contigo as minhas coisas querer partilhar
Não te conheço e penso que tu também não
E por isso não te peço perdão
Peço-te apenas que me confesses
O desprazer que sentes quando estamos sós
Espero que isto fique só entre nós, por enquanto
Porque entretanto irei arranjar maneira de ficar só, acompanhado assim
Por mim, não por ti
Por ti tenho pena
Por ter errado tão prontamente afirmando algo que desconhecia
Porque a ti não te conheço eu assim tão bem
Errar é humano mas nunca fez bem a ninguém
Estranhos é o que na realidade somos
E nada mais poderemos vir a ser
E se sempre ouvi dizer “antes só que mal acompanhado”
Só agora percebi o seu verdadeiro significado

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Cuidado com o que desejas




Estava que nem podia. Doía-lhe aqui, ali, em todo o lado. Eram dores de cabeça e dores no pescoço, malditas palpitações e taquicardia, pontadas que mais pareciam facadas em vários ossos do corpo.
Passou por vários médicos e fez todo o tipo de exames que se recusavam a acusar o que quer que fosse. Tinha imensas dúvidas e fazia sempre inúmeras perguntas mas a reposta era sempre a mesma: “Lamento mas não posso fazer nada, devem ser nervos”.
As dores aumentavam e pareciam espalhar-se agora pelo corpo inteiro. Sentia alterações do ritmo intestinal, da digestão, da pele que parecia envelhecer de dia para dia, dos cabelos que se tornavam fracos, grisalhos e sem brilho, das unhas cada vez mais quebradiças, do sono, ou melhor, da falta dele e as respectivas olheiras como consequência.
Quando alguém conhecido lhe perguntava se estava melhor respondia com um:
“Nem por isso. Sinto o cérebro cansado e o coração mal disposto”.
Perdeu a energia que outrora tivera. Entregou-se ao desgosto. Só lhe apetecia chorar.
Até que um dia, num passeio por Fátima, descobriu as famosas figuras de cera milagrosas à venda. Havia de todas as formas e feitios, desde a cabeça até aos pés, passando por vários órgãos internos e externos. A primeira figura em que pegou foi numa cabeça de adulto. Depois pegou num pescoço e quando deu por sim tinha um corpo inteiro feito de cera.
Assim que chegou a casa construiu o milagroso corpo e contemplou-o na esperança de obter os resultados desejados. Pela primeira vez em muito tempo sentiu-se feliz e enquanto acendia as inúmeras velas daquele estranho corpo feito à sua imagem, desejou que todas as dores que o atormentavam deixassem de existir e o abandonassem para sempre.
Enquanto o seu novo corpo ardia, adormeceu e não acordou mais. A casa pegou fogo, o fumo asfixiou-o e o seu desejo tornou-se realidade.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Rise&Shine




A casa está imunda. O cheiro nauseabundo provoca-me vómitos. Uma mistura de pó, restos de comida, lixo espalhado por tudo quanto é lado, o cheiro a gato, a podridão. Não há nenhum objecto limpo à vista, nenhum bocado de chão nem de parede com a cor original. Até o tecto está manchado de humidade, sujidade, casulos de bicharada porca que aproveita aquele espaço para procriar. Assusto-me com o voo repentino de um dos inúmeros gatos que vagueiam por todo o lado; no chão, em cima dos móveis, em cima dos sofás, na mesa de jantar. Vejo-o a um canto a deliciar-se com o pitéu que acabou de caçar e sinto uma repulsa enorme que me faz querer gritar e fugir, mas sinto-me paralisada e solto um grito mudo. Estou presa e não tenho por onde escapar.
Acordas-me com beijos. Abraço-te. Obrigada por me tirares do meu mundo imundo e me trazeres de volta à realidade… sempre!

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Rest In Pain



Estranha sensação, a de saber que vou parar o corpo e a mente indeterminadamente. Poderia tentar contrariar esta inércia que se apodera de mim, esta maldita entrega ao vazio, mas não sinto nem coragem nem força para tal. Por isso vou-me fechar na minha concha até recuperar a energia suficiente para enfrentar o mundo novamente. Paro de escutar, de olhar, de viver, para passar a sobreviver. E ao adormecer finjo que morro, morrendo de tédio e de desgosto por ser um ser tão fraco, demasiado sensível ao visível e ao invisível. Sofro por tudo, por nada, por mim, por ti, e não sei porquê. Esta dor insuportável que não me deixa descansar em paz é bem capaz de me levar à puta da loucura.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

A.M.A.R.?!




Ando, ando, ando, ando horas e horas a fio. Até sentir as pernas começarem a fraquejar. Até deixar de sentir tudo o que me atormenta. Até me sentir só, tendo como única companhia o teu fantasma que teima em me perseguir, em me atormentar, em me fustigar o corpo e a mente. Estás longe mas sempre presente. Dou por mim junto ao mar e a única coisa que vejo é o teu olhar brilhante que desapareceu assim que te deixei escapar. Sem pensar duas vezes decido entregar-me à sua imensidão assim como me entreguei a ti. E na esperança de que me consigas ouvir, onde quer que estejas, grito: Ainda Me Amas? Responde-me! Podemos escapar os dois? Podemos desaparecer juntos? Só desta vez… E sem obter nenhuma resposta da tua parte, sinto-me a bater no fundo. Fico à espera de te reencontrar para te poder sussurrar ao ouvido: A.M.A.R.?!

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

DIMENSÕES




As ligações mágicas entre as pessoas não se notam, não se vêem, não se forçam, não se criam. Existem apenas e estão lá, à espera de serem descobertas e por vezes sentidas.
Não são muito comuns ou pelo menos não é muito comum falar-se nelas e por isso têm o poder de baralhar o coração, o corpo, a mente de quem as sente.
Quando as sentimos com alguém, perdemos a noção do real pois o que se sente é diferente de tudo aquilo que já se sentiu. É como se fossemos seres diferentes que habitam outra dimensão. Mas esta dimensão é a mesma e é partilhada, sem se saber como nem porquê. É como andar aos pulos desvairados na nossa própria atmosfera, entusiasmados por finalmente alguém ter conseguido entrar. E é nesse momento que aparece uma necessidade de partilha incontrolável, um reconhecimento inexplicável, um turbilhão de sentimentos demasiado fortes e demasiado confusos para serem compreendidos e aceites de ânimo leve. A incompreensão leva à frustração, que dá lugar à desilusão e até mesmo à exaustão.
É o oposto de uma energia estável, de uma energia de Amor. Um Amor de reconhecimento, de companheirismo. Um caminhar lado a lado em passo tranquilo.
Tal como toda a loucura nas nossas vidas:
Para os loucos só a loucura faz sentido!
Para os outros nada disto faz…
Mas apesar de todos os contras, é algo libertador que nos faz sentir vivos e ligados por um Amor incondicional e infinito que me faz querer abraçar-te para sempre.

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Obrigada Di, por me abrires os olhos, a mente, o coração a novas dimensões. Por me teres abraçado assim que nasceste e por saber que jamais me irás largar. Por me teres ensinado a ganhar consciência de coisas que desconhecia e a aprender a controlar a minha energia de forma a ser feliz na loucura infinita que é a vida de todos e para todos nós.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Ser (In)Diferente



A maioria das pessoas aproxima-se das outras por interesse. E seja ele qual for, dinheiro, popularidade, ilusão de verdadeira amizade, sexo, prazer, paixão, amor, poder, não desistem enquanto não conseguem obter o que querem ou até perceberem que jamais o conseguirão. Para que isso aconteça, mentem acerca delas próprias e dos outros, enganam, bajulam, consomem e deixam-se consumir. Por vezes até perdem a própria identidade numa falsidade que vai crescendo e ganhando dimensões inconcebíveis. E para quê? Para saciar a sede de beber o elixir da vida dos outros? Para obter prazer com a miséria e o sofrimento dos mais fracos?
As pessoas metem-me nojo. A mediocridade hedionda fá-las querer trepar e subir, dar passos maiores do que as pernas para poderem espezinhar, pois só assim conseguem obter o falso poder a que acham que têm direito.
Não sou melhor nem pior do que esta maioria imunda. Tenho as minhas qualidades assim como os meus defeitos. Mas felizmente não tenho necessidade de me sentir superior a ninguém. Se é verdade que todos nós temos um papel a desempenhar no mundo, acho que finalmente encontrei o meu e aceito-o, aceitando-me tal como fui, sou e serei, se algum dia o chegar a ser.
Serei diferente ou indiferente? Não sei! Sei que sou eu própria e isso chega-me.