segunda-feira, 30 de agosto de 2010

TAROT_XVII_A Estrela




Estava a ter o pior dia da sua vida. Enquanto tomava o pequeno-almoço a mulher pediu-lhe o divórcio. O carro avariou-se no caminho para o emprego, o que o fez atrasar-se tanto que quando lá chegou foi despedido pelo chefe, que não tolerava atrasos. Enquanto arrumava as coisas para se ir embora viu que tinham chegado os resultados das análises e dos exames médicos que tinha feito. Nem sequer ficou espantado quando viu que sofria de uma doença terminal. Deitou tudo o que lhe pertencia no lixo, despediu-se de alguns colegas e foi a pé para casa. No caminho viu a chave com que jogava sempre, afixada na montra de uma papelaria. Um mendigo que estava sentado à porta estendeu-lhe a mão. Ele pegou no boletim premiado, sorriu e disse:
- Tome lá, amigo!
- Ó homem, porque é que me está a dar isto?
- Porque hoje não me pertence. Só pode ser engano.
Ambos sorriram: um à vida e à sorte, outro ao azar e à morte.

domingo, 29 de agosto de 2010

(In)dependência




Dou…
Dou tudo o que tenho sem nunca pedir nada em troca.
Dou tudo o que sou como se não houvesse amanhã.
Digo tudo o que me passa pela cabeça sem pensar primeiro nas consequências.
Digo o que me vai na alma dependendo apenas do meu estado de espírito, sem pensar na aceitação da minha frontalidade, sinceridade, entrega total, a que quase nunca, quase ninguém está habituado.
Agora paro…
Paro um pouco para pensar, e finalmente acho que estou a aprender a deixar de perder tempo com quem não quer perder tempo comigo.
Porquê?
Para quê?
Para não insistir, chatear, agarrar quem não quer ser apanhado.
Para ter mais tempo para mim, isso sim.
E sinto-me livre, mesmo estando sempre presa a algo ou a alguém.
Sinto-me livre sem o ser verdadeiramente. Aprisionada numa mente e num coração grandes demais.
(In)dependente…
Ainda não sei, mas acho que jamais o serei…

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Fingir-me de t i


A minha alma
mais esquina menos esquina
esbarra sempre em t i
és sempre a pedra onde tropeço
e a queda
é inevitavelmente
tão doce
que quero tropeçar em t i
diariamente
cair em t i
mergulhar em t i
fingir-me de t i
dentro de m i m

terça-feira, 24 de agosto de 2010

TAPARUERES



Um Filosofo do Mundo que toca e (en)canta com a sua visão calma e profunda sobre tudo;
Uma mulher menina cheia de sonhos, desenhos e contos fantásticos de Amor e de Terror;
Uma menina mulher que sabe/faz sempre o que quer e quem sabe se algum dia uma actriz poderá vir a ser;
Uma Poetisa que faz tudo na vida para (sobre)viver e para espalhar as suas palavras, a sua alegria;
Uma jovem que anda ao sabor do vento, sempre com um sorriso estampado na cara e um sentido de humor peculiar que poucos têm a sorte de ter – não esperes mais para começares a escrever as tuas revistas – espero que dêem nas vistas;
Uma mulher e três homens que apareceram e desapareceram sem deixarem rasto;
Um Mestre, Cantor e Escritor de quem não me atrevo a falar mais por em tão alta consideração o ter… só me resta agradecer!
E Eu…
Eu tenho SAUDADES nossas!

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

TAROT_XVI_A Torre



Insatisfação
Frustração
Indecisão
Angústia
Paixão
Injusta
Medo
Ódio
Azar
A vida de adulto é lixada
Acaba sempre numa caixa envernizada

TAROT_XIX_O Sol



És luz
És vida
Fico triste quando estás de partida
Mas ainda mais quando me queimas com o teu calor
Vá-se lá entender o Amor!
Fazes-me Feliz
Isso ninguém me pode tirar
É tão bom Amar Amar Amar
Poderei detestar o Sol
Por seres tu a minha luz?
Ou estarei a exagerar
Por te amar tanto
Ao ponto de quase te odiar…

TAROT_IX_O Eremita



Um dia deixou tudo para trás e partiu sozinho. Farto das pessoas, da civilização, da vida agitada da cidade, da sociedade e de tudo o que de mal existe nela; injustiça, violência, abuso da autoridade, falsa liberdade. Consigo levou apenas uma candeia para lhe iluminar o caminho em noites de lua menos cheia. Andou sem parar até chegar a um monte. Começou a subir mas o monte parecia não ter fim e ele foi subindo. Há muito que tinha perdido a noção do tempo quando atingiu o topo. Olhou para baixo e viu tudo o que deixara para trás sem sentir nenhuma espécie de remorso. Estava velho. Era uma sombra do que fora, mas sentia-se em paz consigo e com o mundo, tendo como única companhia a candeia que o aquecia e lhe iluminava a alma escura e fria, tanto de noite como de dia.

TAROT_IV_O Imperador



De ideias fixas, sabe sempre o que quer e o que não quer. É egoísta e não quer ter mais responsabilidades do que aquelas que já tem. É forte mas tem medo do incerto, tem medo de crescer, tem medo de perder tudo o que já conquistou. Ser e estar acomodado é para ele o mais correcto. E vive bem assim, porque sabe e sente que tem sempre quem olhe por si e para si.

domingo, 22 de agosto de 2010

TAROT_III_A Imperatriz



Poderosa, forte, decidida, responsável, sensível, correcta mas incompleta, sem poder ter o direito de escolher dar à luz o fruto do seu amor. Sente um vazio dentro de si para sempre no corpo e na mente. Fiel ao seu amor, a Imperatriz nunca será completamente feliz.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

TAROT_O/XXII_O Louco



Dás-me música e eu danço tocada
embriagada pelo ritmo avassalador das canções que compões
Alegria
nem sei se chore se ria
Só sei que jamais iria embora
se pudesse ficar para sempre a dançar
aqui ou noutro lugar
Queria seguir-te mas tu não deixas
e avanças sozinho sem fazeres nenhuma paragem
deixando tudo à margem
deixando tudo para trás
mas terás sempre uma multidão fiel que te seguirá
para onde quer que vás

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

TAROT_XII_O Enforcado



Tinha tudo o que precisava para ser feliz: boa casa, bom emprego, bom esposa, boas relações profissionais, familiares e de amizade. Mas desde pequeno que sentia um enorme vazio. Vazio esse que foi preenchendo ao longo da vida com bens materiais. O vazio tornou-se cheio, prestes a rebentar. Enquanto tomava um banho de imersão, pegou na gilete que usava para fazer a barba, tirou-lhe a lâmina e cortou os pulsos. Queria voltar a sentir o vazio e a única maneira que encontrou para isso foi dizer não à vida, e comprando um bilhete só de ida, esvaiu-se em sangue.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

TAROT_VI_Os Enamorados



Porque será que insisto em dar importância às coisas pequenas?
Para a desilusão ser maior do que o costume?
Não sei o que será pior:
se o teu odor
se o cheiro a estrume.
Porque é que não me acostumo a dar-te o devido valor?
Talvez seja o medo do vazio,
porque na verdade nada vales
nem um intenso arrepio
que é o que sinto quando te sinto perto de mim.
Estou cansada de ficar fechada
neste espaço aperreado
em que se transforma a minha mente
sempre que me mentes.
Mesmo quando não me dizes nada
eu escrevo cem palavras.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Saudades



Da vida que não tive
da morte que ainda não chegou
do eclipse que se me escapou

Do que não vivi
do que não presenciei
do que não bebi
do que não sei

Do Sol da noite
da Lua do dia
das estrelas que poderiam trocam de lugar
caindo do céu para o mar
voando de seguida
para à sua casa voltar

De ti e da tua companhia
de quem não conheci
de quem já partiu
de quem ficou
de quem já me amou
do conforto
de não me sentir tantas vezes um peso morto

Tenho saudades minhas…

domingo, 8 de agosto de 2010

TAROT_II_A Sacerdotisa



Não tinha filhos mas era como se os tivesse. O instinto maternal era tão forte que se sentia na obrigação de ajudar todos os que a rodeavam. Desde estranhos, passando por conhecidos, vizinhos, até aos “amigos”, sem nunca pedir nada em troca. Até que um dia precisou de ajuda e viu-se sozinha. Percebeu que tinha vivido em função do bem-estar dos outros que tomando os seus gestos como garantidos nem um pequeno favor lhe retribuíram.
Partiu sozinha sem rumo certo à procura da sua melhor companheira, da sua melhor amiga, da única pessoa em quem podia confiar e com quem podia sempre contar. Partiu em busca de si própria.

TAROT_V_O Papa



(A)Deus e a tudo aquilo que desaprovo:
Intolerância, Ignorância, Ganância,
ânsia de querer sempre mais
atropelando os demais
por nunca estarem satisfeitos com o que têm
excepto com os vossos receios e medos
que dos outros nem vêem
Fanatismo do Povo:
inseguranças que são como lanças lançadas energicamente
Bem lá no fundo sinto o mundo desabar
e num desabafo, abraço a minha insignificância
e a tua falta de significado com ela.
Renego-te - Adeus!

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

TAROT_XVIII_A Lua



Ela despachou-se mais cedo e chegou a casa antes da hora prevista. A casa era nova, acabada de construir, ainda não tinha electricidade. Ouviu barulhos estranhos vindos da sala. Foi espreitar, viu sombras na parede. Estou a ser assaltada, pensou. Silenciosamente foi à cozinha buscar uma faca bem afiada, a um dos caixotes por ali espalhados. A faca brilhou à luz da lua cheia. Assustou-se e deixou-a cair no chão. Os barulhos pararam. O silêncio era ensurdecedor. Encostou-se à ombreira da porta da sala à espera. Quando a primeira sombra saiu, ela espetou-lhe a faca em cheio no coração. As luzes acenderam-se, e sem se aperceberem, gritaram todos em conjunto: SURPRESA!
Ela só teve tempo de ver o olhar de pura agonia nos olhos do seu marido, que os fechava lentamente, enquanto as lágrimas lhe corriam pela cara abaixo e ambos desfaleciam nos braços um do outro.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Hino de solidão

A minha vida é uma sombra, um rabisco numa folha gasta nos cantos pelo passar dos dias, sou um grito cortado antes de o ser, nem eu o oiço, sou dedo que aponta para local que eu próprio desconheço, sinto-me penumbra em sombrio entardecer, que me resta a mim senão apenas fazer cair as palavras e deixar-me apagar no silêncio que se fala dentro de mim?, escuto um grilo que sibila ao longe, mas ele fá-lo só para si, a canção de um é sempre hino de solidão.

Num mar de ondas negras

Há aqui um silêncio tão profundo que me custa andar por entre estas paredes, como se a atmosfera desta casa estivesse cheia de água e os meus movimentos se tornassem lentos, tolhidos pela minha solidão, parece que em cada momento sinto o vazio que penetra todo este espaço, está fora de mim, está dentro de mim, está entre ambos também, em cada esquina da minha própria casa temo escorregar nas lágrimas que querem cair, esta tristeza puxa-me como a gravidade da terra, é o meu coração que me suga para dentro, e mais para dentro, vou-me encolhendo em mim, debruçando-me sobre mim, enrolando-me no meu abraço, sou caracol de dor, espiral enterrando-se na lama que se acumulou no fundo da minha alma, silêncio silêncio e solidão sem fim, a minha música parou, fui multidão que se esvaziou e agora sou somente uma praça vazia dentro de mim, sou como estrela que brilha sozinha em todo o firmamento, a minha luz não me chega, não há espelhos que me reflictam e me devolvam a mim, num mar de ondas negras como a noite é praga e maldição ser semelhante barcaça de luz, permitam-me um naufrágio e tornar-me apenas naquilo que detesto.

(Excerto d'O Génio)

Eternas almas escondidas

Talvez porque a alma seja transparente e o corpo se meça com músculos e palmos de mão, será por isso que somos sempre seres invisíveis, quem somos fica invariavelmente por mostrar, ou por dizer, porque a nossa transparência não se pinta com a cor das palavras que nos saem da boca, nem se vê na dança dos gestos que habitam o corpo, somos eternas almas escondidas, como cubos de ar fechados dentro de caixas, cativos em prisões nunca inventadas, como estátuas encarceradas em blocos de granito por esculpir. A mim nunca ninguém me viu ou verá, o que habita dentro, e que é o sonho maior do meu coração, é mundo incógnito para quem apenas olha, os cotovelos roçam na multidão, mas para esta serei sempre e só um corpo, um corpo com uma boca que grita palavras escritas em dicionários alheios, em nenhum deles encontrei eu algum dia a minha alma, nenhuma palavra foi inventada para mim, nenhuma delas nasceu de dentro de mim, todas vêm de fora e, quando as volto a lançar para a multidão, elas levam somente o meu cheiro, não aquilo que sou, o cheiro é sempre pista para algo mais, indício daquilo que talvez não se veja ainda, mas já se sabe existir, quem me vê apenas sabe que aqui estou, o meu corpo é o meu porta-voz, mas a voz que ele transporta e que é o que se esconde por dentro, essa ninguém procura, sabe-se que existo, como ou porque existo?, isso continua um mistério, como um corpo de braços abertos por detrás de um muro.

(Excerto d'O Génio)

domingo, 1 de agosto de 2010

TAROT_XXI_O Mundo



Listen to the sound
This sound of no silence
This alliance is all around us
My head is filled with everything
Laughs, Live, Joy, Happiness, People
But not everyone
Everyone else is watching us
Without any sympathy
They’re afraid to feel the same
Afraid to run and smile like a child
Emotions free
But they’re all here
Inside you & me
Giving us the pleasure of enjoying ourselves
Our company
I bleed for you and you bleed for me
So we can become blood brothers
But like no others
Cause we know what we are and what we can be
One, Two, Three
In our perfect circle
In our perfect love boat
In our perfect tree
Only us & this alliance
Without a word, without a note
But this sound of no silence

TAROT_XX_O Julgamento




Ela achava-se bela. Um dia sentou-se em frente ao espelho e só saiu de lá quando, já velha, morreu de desgosto por se ter tornado tão feia.
- Parece uma múmia!
- E é. Dizem que esteve aí sentada durante 50 anos.

TAROT_VIII_A Justiça


É sempre bom reflectir antes de tomar decisões, mas não demais…

A Sra. Indecisão acordou cedo e como de costume vestiu um colete e uns corsários, pois nunca conseguia decidir se sentia frio ou calor. Calçou uns ténis confortáveis porque sabia que se tivesse de ir à rua iria andar a pé fosse para onde fosse porque não conseguiria decidir qual o transporte que deveria apanhar. Os pés calejados de tanto andar, doíam-lhe, e apesar das unhas sujas e de alguns fungos que teimavam em não desaparecer devido ao descuido, não os lavou, porque nunca conseguia decidir se os devia lavar antes ou depois das suas caminhadas. De seguida penteou o cabelo que lhe dava pelos ombros sem corte definido, com algumas madeixas, que fez por não ter conseguido escolher uma só cor, e com a sua cor natural já a aparecer nas raízes.
Estava em casa sem saber o que fazer, quando ouviu o telefone tocar, e pensou:
Quem será? Será para mim? Será engano? Devo atender ou ignorar?
A sua estatura e peso mediano deveriam pertencer a um andar decidido, mas não pertenciam e ela caminhou com passos incertos e inseguros até junto do telefone.
E ficou perdida nos seus pensamentos durante o tempo suficiente até este se calar.
Logo de seguida a Sra. Indecisão pensou:
O que faço agora? A lida da casa, vou às compras ou devo ficar junto do telefone e esperar que toque novamente?
Até que perdeu a noção do tempo todo que esteve a tentar decidir o que fazer a seguir e passou a manhã inteira imóvel junto ao telefone que não voltou a tocar, à espera, já nem ela própria se lembrava de quê.
À hora do almoço tocam-lhe à porta e a Sra. Indecisão recomeçou a ter pensamentos semelhantes aos anteriores:
Quem será? Será para mim ou será engano? Devo atender ou ignorar?
E nisto estremeceu de susto com a voz rouca e familiar que ouviu do outro lado da porta, vindo da rua:
- Sei que estás em casa! Abre-me a porta! Sou eu!
A Sra. Indecisão não foi capaz de ignorar a ordem da sua vizinha do lado e abriu-lhe a porta imediatamente.
Cumprimentaram-se e estava tudo a correr bem. A vizinha comentou a decoração da sua enorme casa:
- Que engraçado! Tens poucas coisas, mas todas com estilos tão diferentes.
A Sra. Indecisão continuou calada, até que a vizinha lhe perguntou:
- Queres ir almoçar fora?
Esta pergunta foi um verdadeiro martírio para a Sra. Indecisão, que só teve tempo de arquear as sobrancelhas assimétricas e os seus olhos estrábicos ficaram com um ar perdido e mais inseguro que o normal. E respondeu:
- Sei lá
Não imaginam o chorrilho de perguntas que a pobre coitada teve que ouvir logo de seguida:
- Mas tens fome ou não tens fome? O que queres comer? Mandamos vir ou almoçamos fora? Onde? Sítio barato ou caro? Carne ou peixe? Não me digas que já te tornaste vegetariana! E que tal Sushi? Ou tens nojo?
Isto foi demais para a Sra. Indecisão, que sem conseguir responder a uma única pergunta, deixou-se ficar imóvel sem dizer uma única palavra, e começou a roer as unhas, cada uma pintada da sua cor.
A vizinha como percebeu que não ia obter nenhuma resposta disse-lhe muito a pressa:
- Olha, já percebi que não deves estar com muita vontade de ir almoçar comigo. Falta de apetite, talvez! Deixa lá mulher, fica para a próxima. Tchau tchau! – e saiu porta fora.
A Sra. Indecisão deixou-se ficar imóvel, parada junto à porta, sem conseguir decidir o que fazer, sem conseguir sequer mexer-se, apenas a sentir os segundos, os minutos, as horas, os dias, os meses a passarem por si. Até que sentiu as duas alianças que usava sempre nos dois dedos anelares, agora excessivamente magros, caírem-lhe.